Surpreendente: arrozeiras armazenam água, e a água pasmem(!) vai abastecer nada menos nada mais do que Balneário Camboriú – a praia dos arranha-céus. Notícia mais que alvissareira. Vibram os arrozeiros da vizinha Camboriú, agora produtores de água. Jogo do ganha-ganha.
Há tempo o conflito: agricultura versus dessedentação humana, preocupa. Em caso de estiagem, qual a prioridade? O abastecimento urbano, obviamente. O modelo em curso, sabemos, caracteriza-se pela crescente urbanização. As economias desenvolvidas foram as pioneiras. É célebre o modelo inglês. Milhares de pessoas migram para os centros urbanos que só não explodiu por conta de migração. A Austrália, por exemplo, foi colonizada por prisioneiros ingleses.
Ao campo sempre foi legada a missão de fornecer alimentos, em abundância e baratos. Excedentes: a alavanca do capitalismo. Excedentes alimentares, de capital, e por aí afora. E, sobretudo, de mão-o-obra.
Duas agriculturas se destacaram e se destacam neste contexto. O agronegócio, superespecializado, voltado ao monocultivo. E, a agricultura familiar, diversificada. A primeira monótona, a segunda vibrante. Monótona pela dispersão territorial, mas extremamente produtiva. A agricultura familiar não foge à regra, embora prevaleça o viés social.
Mas, afinal o que tem as arrozeiras a ver com tudo isso? De todas as grandes culturas, o arroz diferencia-se. Milenar, a exemplo do trigo; distingue-se, no entanto. Não há como se falar em arroz sem associá-lo à água. Assim foi sendo melhorado ao longo dos séculos. De tal forma que os arrozeiros na Ásia são conhecidos como agricultores de cinquenta séculos. Confúcio, em 2.356 a.C. se refere a obra de irrigação mandada construir pelo imperador Yan, no período, Shen-Nung, na China. Documentos de 2.800 a.C. mencionam a importância do arroz na vida social, religiosa e econômica da Índia.
Em Santa Catarina, a cultura do arroz ocupa lugar de destaque na vertente atlântica; não por acaso, região onde ocorre um processo acelerado de urbanização. Planta colonizadora, gradativamente expandiu-se em áreas alagadiças. Várzeas. Melhoramentos genéticos e aprimoramento de tecnologias elevaram sobremaneira a produtividade.
Ultimamente, no entanto, conflitos aguçaram-se. Disputa por água e, a questão dos defensivos agrícolas. A fronteira agrícola, exauriu-se. Portanto, não há como expandi-la. Resta somente investir-se na produtividade. Mesmo quanto à produtividade, no momento, estamos no limite, dez toneladas por hectare (área equivalente a um campo de futebol). O que fazer então para aumentar a renda? Muito pouco, certamente. Ou migra ou diversificam as atividades.
Polêmicas à parte, mesmo assim, os arrozeiros resistem. Até quando ninguém sabe, haja vista a pressão urbana. Arrozeiras valem ouro, o ouro urbano (loteamentos); não o agrícola.
Nesta conjuntura, a disputa por água acirra-se. E os arrozeiros que sempre lutaram para proteger os mananciais enfrentam um cenário inesperado. Os tabuleiros, antes defenestrados pelas companhias de água – “concorrência desleal” -, tornam-se subitamente fator de reserva hídrica. Isso mesmo: reserva hídirica.
Não só contribuem para manter as águias subterrâneas, como também, ao armazená-las, minimizam as enchentes. E com isso, de lambuja, regularizam o abastecimento urbano, especialmente no verão. Tempestade perfeita.
Por essa ninguém esperava. Menos ainda os arrozeiros. Enfim uma boa notícia: produção de água e alimento ao mesmo tempo: alternativa mais do que plausível.
Onévio Zabot
Engenheiro Agrônomo
Artigo publicado no Jornal Notícias da Vila - edição de março.
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